Uma das coisas que me impressionaram na viagem a Buenos Aires
é a auto-estima dos argentinos. A fama é conhecida, mas agora “experimentei” de
perto. Uma auto-estima que beira a arrogância, às vezes. Mas só um país com boa
auto-estima consegue manter viva e bem preservada tanta história, através de
seus monumentos, prédios, praças, ruas e principalmente da sua gente. Não é a
toa que Buenos Aires não pára de crescer como um grande destino turístico, e sagrou-se a “capital europeia” da América Latina, o que
já não dá lá muito crédito, considerando a situação atual de muitas capitais
europeias (mas isso é outro assunto, voltemos...). E isso tudo apesar dos
imensos problemas sociais e econômicos que enfrentam e conhecemos bem. Aliás,
enfrentam mesmo, vão pra rua, lutam pelos seus direitos, ocupam os espaços
públicos, brigam, esculacham o governo, mas me parece não perderem nunca o
sentido de pertencimento àquela pátria, e a defendem acima de tudo. O que é bem
diferente do complexo de inferioridade e a “raiva”, eu me arrisco a dizer, que
desenvolvemos no Brasil pelo Brasil, ao longo da nossa história.
Pois é... Comecei com a Argentina, mas quero mesmo é falar de
nós, brasileiros. Motivada pela vontade de entender o que realmente passa na
cabeça das pessoas que só achincalham o Brasil, mas nem por isso planejam ir
morar em Zurique ou Copenhague. Basta “passar um pano” no Facebook e vai
entender o que quero dizer. Pra mim, por enquanto, uma certeza: Somos um povo
contraditório. Somo alegres, festeiros, empreendedores e temos fama de
cordiais. E ao mesmo tempo tratamos mal a nossa própria gente e o nosso próprio
país.
Tem gente que é implacável nas críticas contra o Brasil. E que prontamente reproduz qualquer
informação ruim, mesmo sem ter certeza da veracidade, xinga, critica,
esculhamba. Agora, quando ouve uma notícia boa, não dá valor. Pelo contrário,
logo pensa, ou pior, diz: “ah, isso aí é mentira, informação plantada por esse
bando de políticos filhos da puta”. Isso pode ser verdade? Claro, e
infelizmente. Mas mesmo quando a notícia é séria, divulgada por Institutos e
pessoas sérias tem gente que faz questão de achincalhar. E muitas vezes,
simplesmente por ter uma postura ideológica diferente, ou por ignorância ou mau
caratismo mesmo. A verdade é que as pessoas confundem Nação com Governo.
Ninguém é obrigado a gostar de quem está no governo, mas isso não é a mesma
coisa que torcer sempre contra o seu país.
É claro que temos muitos motivos para nos indignar e
decepcionar com acontecimentos que ocorreram e ocorrem em nosso país. É claro
que a realidade esfregada na nossa cara diariamente, como as desigualdades
sociais; a decepção com muitos dos nossos representantes políticos; todos os tipos
de preconceitos; nossas taxas de analfabetismo; a violência; enfim, nada disso
é capaz de provocar um sentimento ufanista. Mas daí a repetir incansavelmente
frases como: “ O Brasil não tem jeito mesmo”; “Eita paizinho de merda”; e
outras coisas do tipo tem uma larga diferença, e uma boa dose de má vontade. Diante
disso, me resta acreditar na constatação de que nós brasileiros (ou uma boa parcela
de nós) temos uma péssima auto-estima. O que pode não ocorrer com você
pessoalmente, mas como povo, como sociedade, como país, sim.
E penso também que a auto-estima de um povo não depende só do
desenvolvimento social, econômico e cultural do seu país. Depende também da
postura das pessoas diante da vida. De ter uma visão otimista e positiva do
futuro, e mais do que isso, de fazer a sua parte, de buscar as transformações. Agora
é a hora que você vai pensar: essa coisa de cada um fazer a sua parte soa como
um velho “clichezão”. Pois é, e nem assim...
Somos um país rico em gente. Isso é muito bom, e ao mesmo
tempo um problema. Porque temos todo tipo de gente. Gente demasiadamente burocrática.
Gente demasiadamente egoísta. Gente demasiadamente sonhadora e idealista. Gente
demasiadamente acomodada. Gente demasiadamente capitalista. Gente
demasiadamente insatisfeita. Gente demasiadamente irônica. Gente demasiadamente
critica. Gente demasiadamente alienada. Gente demasiadamente ignorante. Gente
demasiadamente trabalhadora. Gente demasiadamente vagabunda. Gente
demasiadamente arrogante. E ainda temos gente demasiadamente com fome, sem
educação e sem saúde. E também gente letrada, e ainda assim ignorante. Todo o
tipo de gente. E todo tipo de gente misturados também dentro da gente. Ainda
assim, quero acreditar que somos - e seremos sempre - gente capaz de absorver e
lidar com tantas contradições.
Será mesmo que o Brasil não tem jeito? Será mesmo que somos
bons apenas em samba e futebol? Será que não estamos acomodados demais no
pensamento que “já fudeu mesmo”? Será que nos sentiremos o resto da vida a
colônia coitada e desvirginada por Portugal?
Por que não somos capazes de no dia a dia dar o mesmo “show
de civismo” que damos ao torcer pela
Seleção Brasileira de Futebol? Estamos nos preparando pra fazer isso na Copa
do Mundo, que será “nossa”. Isso é uma outra coisa que eu gostaria de entender.
Lá entoamos o hino, nos emocionamos, gritamos pela seleção. E é futebol. Depois
reclamamos que nos conhecem apenas pelo futebol, o carnaval, as mulatas e os
macacos da Amazônia.
Quero dizer que não tenho nada contra o futebol, ou torcer
pela seleção. Adoro futebol e também vou torcer pela seleção. E sobre o que
dizem as más línguas, que futebol é um dos ópios do povo, só tenho uma coisa a
dizer: que seja! Um pouco de ópio no meio de tanta realidade não faz mal a
ninguém.
Respondendo o que perguntei ali em cima: Sim, pra mim, o
Brasil tem jeito. E o jeito é a gente que começa a dar. Cada um de nós.
Não tenho nenhuma intensão de ter um discurso nacionalista ou
ingênuo. Eu simplesmente não entendo quem tem vocação para passar a vida
amargurando coisas ruins. Ou quem passa a vida reclamando de tudo, com e sem
razão. E se pensarmos que podemos morrer amanhã, atropelados por uma jamanta,
ou de qualquer outra maneira, pode ficar mais fácil superar tanta amargura e
tentar buscar felicidade em todos os momentos. Sem drama, mas é isso. Com
relação ao Brasil e tudo o que acontece nele, a ideia não é se acomodar e
aceitar. A ideia é se posicionar sempre, brigar pelo o que acredita, criticar o
que está errado, mas sem deixar de reconhecer o valor que temos e tudo que já
conquistamos nos (ainda breves) quinhentos e poucos anos de vida.
Meu desejo: Que consigamos superar esse teimoso complexo
colonial e passemos a enxergar também o que temos de bom, e agora, eu não estou
falando de futebol, carnaval e mulher bonita, não. Eu estou falando de gente
valorosa, de recursos naturais abundantes e exuberantes; de um país que vem
conquistando espaço e respeito no mundo, apesar de toda torcida contra.
Para acabar, tudo isso é pra dizer que apesar dos pesares, daqui
eu não saio, nem pra Dinamarca. Ah, e pra dizer também que muita amargura
faz mal para o fígado e para alma.