31 de julho de 2013

Sobre religião, Deus e tolerância.


Falar de religião, que é um tema, naturalmente, controverso, não é simples. Talvez, porque toque nas crenças, nas fragilidades, nas dúvidas, nas inseguranças e nos sentimentos mais profundos das pessoas.  E isso, com alguma frequência, faz com que evitemos falar do assunto, já que numa conversa desse tipo, as opiniões muitas vezes são antagônicas e apaixonadas, dificilmente racionais, o que pode causar discussões acaloradas. Pra mim, é uma ótima oportunidade de exercitar tolerância.

Duas coisas me motivaram a escrever sobre esse assunto. A vinda do Papa ao Brasil e o episódio da Marcha das Vadias no Rio quebrando as imagens das Santas. Além de uma pergunta curiosa que me fizeram dia desses: “Ju, eu te conheço há muito tempo e tenho uma idéia da sua postura com relação à religião. Mas, o que você pensa exatamente sobre a nossa existência, sobre Deus, sobre religião”? Ai ai ai, que pergunta difícil! Tive que pensar bem pra responder e só sei que ao final da minha resposta, ele (que é ateu) olhou pra mim e disse: “Você é ‘quase’ uma agnóstica”. Não parei de pensar nisso desde então, aliás, acho que ninguém nunca deixa de pensar e de questionar a si mesmo e ao mundo sobre essas questões da existência. Pelo menos, acho que não deveria. Eu me convenço cada dia mais, que essas reflexões só nos melhoram como seres humanos, mesmo quando não encontramos todas as respostas.

Eu nasci e cresci numa família católica apostólica romana, que sempre frequentou e participou ativamente da igreja. Fui batizada, fiz primeira comunhão e crisma. E costumo brincar, que logo depois, quando tinha uns 14 ou 15 anos, desvirtuei. Mas, é brincadeira mesmo, não é isso o que eu penso, mesmo porque não acho que ir à igreja seja uma virtude, basta prestar atenção em como são e agem algumas pessoas que frequentam a Igreja e se julgam os paladinos da moral e dos bons costumes. E melhores do que os que não vão. Ah, tá bom...

Eu, na verdade, comecei a perceber que aquilo, simplesmente, não servia pra mim. Já não me acrescentava. Entre muita gente séria, compromissada e que estava ali pela sua fé, por amor, e por realmente acreditar na diferença que aquilo faz em sua vida, comecei a perceber também incoerência, hipocrisia, falso moralismo, enfim... E isso não tem nada a ver com fé, ou com Deus, tem a ver com gente.

Mas, é pra mim que a Igreja não teve e não tem peso. Pra muita gente, inclusive para pessoas muito próximas de mim, ela foi e é fundamental. A diferença é a motivação. Alguns vivem a Igreja com serenidade, por amor, por solidariedade, por fé verdadeira, com alegria. Outros são vítimas do que podemos chamar de uma verdadeira "coação religiosa", vivem a Igreja por medo. O que, infelizmente, interfere profundamente na vida dessas pessoas, especialmente das mulheres, eu arriscaria dizer. Interfere no modo de pensar, de fazer escolhas, de falar, de sentir prazer, de se comportar diante das pessoas e do mundo. Até mulheres modernas, independentes, inteligentes, acabam subservientes a essa igreja, que coage. E isso tudo, apesar de toda evolução do mundo e da própria igreja, como alguns insistem em apregoar que houve, é consequência de um ranço moralista, conservado até por aqueles que o rejeitam.

Não acredito em religiões, porém respeito verdadeiramente as pessoas que acreditam, mesmo sabendo que o contrário, nem sempre é verdade. É incompreensível para algumas pessoas, que outras possam simplesmente não acreditar no mesmo que elas, ou até, não acreditar em nada. E isso pra mim é egocentrismo, arrogância e, em alguns casos, até uma certa limitação intelectual, daquelas que cegam.

Eu, pessoalmente, acredito em Deus. Mas do meu jeito, no Deus que eu imagino existir. Não acredito na Igreja, porque não acredito em seus dogmas. Não acredito numa Igreja com idéias da idade média, que prega contra o uso de preservativos e anticoncepcionais; que com o seu discurso, pode estimular a homofobia; que prega igualdade e justiça social, mas ostenta uma riqueza imensurável, a começar pelo Vaticano, onde está a sua autoridade máxima, o Papa. E não acredito na Igreja que diz preparar seus fieis para conquistar o paraíso e a vida eterna. Se faz isso, está fazendo muito mal feito. 

Também não acredito em pecado, acredito em escolhas boas e ruins, no discernimento das pessoas. Não acredito em céu e inferno. Pra onde vamos, então? Como é que eu vou saber? Na verdade, nem quero, não estou com pressa. Não acredito na eficácia de usar a Igreja como muleta para as fragilidades humanas, como meio de superar sofrimentos e alcançar felicidade. Conquistar isso está dentro de cada um. Enfim, não acredito em religião. Não nessas que estão postas aí. Acredito sim, que respeito, tolerância, solidariedade, coerência, deveriam ser a “religião” universal.

Quanto ao episódio das “vadias” quebrarem as Santas, só tenho uma coisa a dizer: eu não faria. E não por moralismo, ou porque acredite ou venere as estátuas de barro, não. Mas, porque isso tem um simbolismo importante pra muita gente, e é desse respeito que eu falava. Tudo bem que a idéia é incomodar mesmo, e quebrar umas santas e umas vidraças é uma forma, digamos, incisiva, de protesto, de chamar a atenção. Ainda assim, existem outras maneiras, que podem ser até bem mais eficientes, quando não atingirem as crenças da maioria da população do país. Acho a estratégia  equivocada.

Quanto ao Papa, dizem que este, o Francisco, é “diferente”. Um jesuíta que chegou com a idéia de renovar a Igreja. Também só tenho uma coisa a dizer: Deus os ouça!

Os meus desejos: que todas as pessoas, sejam de qual religião forem, ou de nenhuma, possam conviver sem intolerância e com respeito pela diversidade religiosa, e todas as outras. Que as pessoas tenham a capacidade de refletirem com crítica sobre as suas próprias religiões. Que as pessoas possam encontrar as respostas que procuram, mas que tenham consciência de que elas nem sempre existem. Que saibam, verdadeiramente, porque fazem parte de uma religião, e que não sejam simplesmente, condescendentes com determinada doutrina, por comodismo, culpa, medo de perder seu “lugarzinho no céu”, ou outras "limitações".

Enfim, se você gosta mais de São Tomás de Aquino e de seus argumentos pela existência de Deus, ou de Darwin, com a sua teoria da evolução, ou ainda se prefere, Karl Marx, ateu que afirmou que a religião é o ópio do povo, uma coisa é certa, vivemos numa sociedade plural, com liberdade de pensamento e muitas crenças. Por isso, só nos resta aprender a conviver na diversidade, sem perder a capacidade de questionar, de refletir e de transformar pra melhor o mundo, a começar (sempre) por nós mesmos. E sem a pretensão de achar que a compreensão da vida, de Deus, da existência, das pessoas, possa ser maniqueísta e sempre racional. Às vezes, simplesmente, não há resposta. Mas, sempre há escolha.

“Quando pratico o bem, sinto-me bem; quando pratico o mal, sinto-me mal. Eis a minha religião”. Abraham Lincoln








29 de julho de 2013

CHILLI


Várias pessoas me pediram a receita do Chilli, então preferi postar aqui e quem quiser pode “servir-se”!

O Chilli é uma receita fácil. O segredo está no ponto (consistência), que no caso desta receita, deve ser pastoso, e no equilíbrio dos temperos, especialmente o cominho e a pimenta chilli, o que neste caso, pode te dar algum trabalho, porque não sei dizer as quantidades dos temperos, já que tempero “a zóio” e vou experimentando. Sempre faço duas versões, uma mais picante e uma menos (para os fracos!!!).

Mais uma coisa... Tenho grande dificuldade em fazer comida pra pouca gente. Essa receita serve 10 pessoas “bem comidas”, e sempre sobra! Portanto, se quiser fazer em menor quantidade, divida a receita proporcionalmente.


Receita do Chilli (é exatamente a receita da foto)

1 kg de feijão carioca 
1,200 Kg de carne moída magra (uso Patinho)
3 colheres (sopa) de azeite
1 cebola grande picadinha
5 dentes de alho amassados
1 lata de extrato de tomate
2 latas de molho de tomate
1 pitada de orégano
2 folhas de louro
½ maço de salsinha picadinha
Cominho (em pó)  “a zóio”
Pimenta chilli (em pó) “a zóio”
Páprica picante (em pó) “a zóio”
Sal “a zóio”

Modo de fazer:

Cozinhe o feijão até ficar bem molinho, amasse (ou com um processador) ou na raça (garfo), e reserve. Deve ficar uma pasta de feijão. Pode deixar alguns grãos inteiros, se preferir.

Prepare a carne, como se fizesse um molho à bolonhesa. Frite a cebola e o alho no azeite, e refogue a carne. Acrescente o orégano, o louro, o sal, o extrato, o molho de tomate e água filtrada. Deixe cozinhar e reduzir até ficar com bem pouco caldo. Acrescente a salsinha.

Quando a carne estiver pronta, acrescente o feijão, misture bem e tempere com o cominho, a páprica e a pimenta chilli (cuidado aqui!). A quantidade dos temperos depende do gosto do freguês. Vá colocando aos poucos e experimentando, pra não errar a mão! Agora é só corrigir o sal e o seu Chilli está pronto!


Acompanhamentos (com quantidade proporcional a essa receita de Chilli):

- 12 tomates sem sementes picados em cubinhos
- 4 pimentões pequenos picados em cubinhos (1 vermelho/1 amarelo/2 verdes)
- 1 Kg de queijo prato ralado grosso
- 600 g de Nachos. Pode usar os originais (difícil de achar um bom em Londrina), pode usar Doritos Nachos (é o que faço) ou se for muito virtuoso, pode fazer os nachos em casa (não compensa).
- Guacamole (receita anexa)

Receita do Guacamole (opcional):
2 abacates maduros
1 cebola roxa média bem picadinha
1 dente de alho amassado
1 tomate sem sementes bem picadinho
2 pimentas dedo de moça (sem sementes) bem picadinhas
¼ de um maço de coentro muito bem picado. Nem todo mundo gosta de coentro. Pode usar salsinha.
1 limão (suco)
Sal

Modo de fazer: Amasse os abacates e junte todos os outros ingredientes. Misture bem, coloque o suco de um limão e sal à gosto. Dá pra acompanhar o chilli e pode ser também um aperitivo, pra comer com nachos.

Sugestão na hora de comer: monte o prato em camadas. Comece pelo chilli, depois o queijo prato (que já vai derretendo), o tomate, o pimentão, e por último o guacamole (pra quem gosta). Os nachos, você pode quebrar em pequenos pedaços e jogar por cima. Ou deixa-los inteiros e ir pegando o chilli com os próprios nachos. It´s up to you, baby!

Bom apetite!!!






10 de julho de 2013

Devaneios atuais...

Ontem à noite, depois de uma discussão OSPBistica em casa, que não é rara, fiquei pensando: Em que baseio as minhas opiniões e convicções? O que eu sou? Que eu sou "canhota" já disse aqui, e isso é líquido e certo. E de onde isso vem?

De vários lugares, penso eu. Do ambiente, da criação, dos interesses, da formação, da informação, da personalidade, da educação, mas, principalmente, da alma, da essência.

Vem, por exemplo, de quando eu tinha 15 anos, muitos sonhos e um espírito libertário. E na época do Plebiscito de 1992, para escolher a forma de governo do nosso país, fui com outros jovens, amigos e conhecidos, para o calçadão de Londrina divulgar e defender a Anarquia. Pois é, um tema que desde muito menina me atraiu, li sobre ele, estudei, defendi. Era nisso que eu acreditava e sonhava. E ainda tenho em mim esse espírito. Mas, depois que a gente cresce, e a vida não é mais só música, amigos, escola e lutar por um ideal... Depois que a gente vira mãe, trabalha, paga contas, e vive nesse mundo tão real, começa a perceber a realidade com outra perspectiva. E hoje pra mim, no ponto em que chegamos, infelizmente, aquele arranjo social idealizado e defendido por Godwin, Bakunin, e tantos outros, está cada dia mais distante, improvável, utópico.

Toda essa história de ter que amadurecer, encarar os problemas, as dores (nossas e dos outros), e ver que a incoerência, a realidade e a brutalidade da vida, não é só o que se vê retratado na TV, ela está na cara de quem admite vê-la, pode fazer com que comecemos a desanimar. Mas isso, só se você estiver aqui só de passagem, sem vontades, sem convicções. Caso contrário, percebemos rapidamente que é possível ser feliz depois que a gente cresce, apesar dos pesares.

Hoje, com tantas coisas acontecendo, as pessoas nas ruas (pelo menos até uns dias atrás), as discussões nas mídias sociais, a troca de idéias, gente cobrando, gente “tentando” dar respostas, enfim, existe movimento, existem lados, existe discussão, existem contraditórios, existem consensos, e isso tudo é fruto da democracia. Hoje, é a ela que me apego. E gosto dela. Mas, sei também que ela tem um preço, às vezes alto, mas que vale à pena.

Tudo isso, só pra dizer que tudo muda. O mundo muda, o Brasil muda, você muda, eu mudo... Mas, o que importa, pelo menos nas pessoas, é a essência, o que você traz dentro de si, e o que você é capaz de fazer para transformar a realidade. E a despeito da minha idade, de ser ainda uma “menina” de 35 anos, eu sei o que trago dentro de mim. E tenho um acordo comigo mesma, o de nunca perder esse brilho rebelde e provocador da alma.





4 de julho de 2013

Um lero com o meu tio, Betão! Azar seu que não o conheceu!

Sabe tio Betão, no próximo mês faz 3 anos que você partiu dessa, se é pra melhor ou não, eu não sei e nem tenho pressa em saber. O fato é que eu tenho sonhado muito com você. Então, fiquei com vontade de “bater um papo”, como fazíamos sempre, e de te contar um pouco como andam as coisas por aqui.

Pra começo de conversa, quero dizer que você nunca vai nos deixar de verdade, já que está sempre presente. Seja nos papos das reuniões familiares que, aliás, continuam “daquele” mesmo jeito; nos nossos pensamentos; nas piadas que lembramos que você contava; ou nas coisas engraçadas que você dizia e que sempre repetimos. Você foi sei lá pra onde, mas apesar da saudade que sentimos de você e da sua presença, mesmo de longe, ainda nos diverte com a sua irreverência.
Não sei por que tenho sonhado tanto com você, meu tio. Talvez, porque eu esteja numa fase sensível e você tenha sido uma pessoa muito importante na minha vida. Talvez, porque você queira me dizer alguma coisa e resolveu me trolar, porque nunca diz. Ou talvez, você só queira me “encher o saco” mesmo, como sempre fez.
Quem te conheceu sabe bem como você foi. Mas, pra quem não teve o privilégio da sua convivência, vou contar um pouquinho como você era, na minha perspectiva. Como era o Betão, ou o tio Roberto. Eu nunca tive um jeito só de te chamar.
Você era um sujeito diferente e muito autentico. Nada preocupado com convenções sociais e nem um pouco preocupado com aparências, com nenhum tipo de aparência, aliás. Andava com as calças caindo e sempre abotoava a camisa errado, sobrando um botão, para o pavor da Marildinha, que vivia tentando te “ajeitar”. Você gostava das coisas simples e também preferia as pessoas simples. Era impaciente e detestava falar ao telefone. Gostava muito de apreciar a natureza (posso até ver você lá no fundo da chácara, dizendo como era lindo tudo aquilo). Você adorava os animais. E gostava de bater papo (só até te dar sono) e de tomar uma no Toninho, não o famoso, aquele da esquina da sua casa. Também tocava acordeon e a música que mais lembro de você tocando é Ronda. Mas, também, só tocava quando queria, apesar de toda insistência da família. A única que o convencia era a Vó Helena. Nossa! Falando nisso, ela deve estar te dando trabalho aí.

Você tinha um rigor de caráter impressionante, que deveria ser natural, mas é muito escasso nos dias de hoje. Esse rigor ensinou e cobrava de todos nós, seus sobrinhos, seus filhos e todos que conviviam com você. E posso te dizer uma coisa, tio? Não sabe como isso faz diferença na nossa vida.
 Apesar de respeitar muito as pessoas, quando alguma coisa não lhe agradava e se tinha o mínimo (o mínimo mesmo) de intimidade, mandava logo um “vai tomar no cu, seu corninho sem vergonha” e isso, pra você, não era desrespeito, e nem pra quem ouvia, quando vinha de você. 

No meu primeiro emprego de verdade, lá no Buffet, quando eu tinha 14 anos, você era o meu chefe. Lá aprendi muitas coisas que até hoje trago pra vida. Além dos meus pais, você foi um grande exemplo de responsabilidade e honestidade. Aprendi a respeitar horário, respeitar tratos e o mais importante, respeitar pessoas, todas elas. Lá também tivemos nossas discussões, que não duravam nada e que a Dona Gera dava logo um jeito de botar panos quentes. Mas essas discussões só aconteciam, em função dos papeis que desempenhávamos no trabalho e na vida. Você sempre cobrou muito compromisso e responsabilidade e, às vezes, daquele seu jeito meio torto. E eu, apesar de todo respeito que sempre tive por você, estava aprendendo e nunca soube ficar quieta sobre o que eu penso. Isso tudo também me fez crescer como pessoa e como profissional.
Foi você quem me emprestou, para ler, quando eu tinha uns 15 anos, aquele livro do Malba Taham, "O homem que calculava". Lembro claramente de alguns capítulos, como o dos 35 camelos; o das 90 maçãs; as curiosidades numéricas do Alcorão... Enfim, foi um livro que me instigou, me marcou, que li muitas vezes depois e que ajudou a construir o meu gosto pela leitura, já incentivado pelo meu pai. A partir dali gostei muito mais de leitura, de matemática e de possibilidades.

Betão, sabe o que você foi pra mim? Um exemplo de irreverência e coerência. Um tio de um humor que variava muito e assim mesmo era divertidíssimo. Um homem generoso e muito simples. Foi mais um exemplo de como levar a vida reta. Um tio que me deu muitas caronas pros shows de rock e, às vezes, entrava junto, pra “conhecer” o ambiente. Um tio que quando eu liguei, foi me buscar correndo em Águas de São Pedro, quando me meti num estágio furado e estava quase “em depressão”. Enfim, um tio com quem eu sempre contei.
Betão era um homem com espírito “anarquista, graças a Deus”. E nem era advindo da Itália, muito menos da família da Zélia Gatai. Na verdade, isso nada tem a ver com a obra. Era só um filho de espanhol, turrão, contestador do sistema, um espírito anarquista que acreditava em Deus (quem disse que não dá?), mas do seu jeito. Exemplo disso, é que quando resolvia ir à missa, preferia ir a Capela do Santa Fé, um bairro muito pobre de Londrina, do que ir à Igreja onde a família toda frequentava. Lá, no Santa Fé, ajudava na creche, nas festas populares para angariar fundos, conversava com as pessoas, enfim, lá, sabia que poderia fazer alguma diferença, aí fazia sentido pra ele.

Tio Roberto, as coisas por aqui andam quentes, o povo foi em massa pras ruas, mas não vou esquentar a sua cabeça com isso. Só pra ter uma idéia, vou emprestar uma música do Chico, de quem você gostava e que pode ilustrar nossos dias: “... Aqui na terra tão jogando futebol. Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll. Uns dias chove, noutros dias bate o sol. Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta. Muita mutreta pra levar a situação. Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça. E a gente vai tomando que também sem a cachaça. Ninguém segura esse rojão... Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta. É pirueta pra cavar o ganha-pão. Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro. E a gente vai fumando que, também, sem um cigarro. Ninguém segura esse rojão...”. Pois é!
Tio, tá tudo “assim”, mas você já pode ficar tranqüilo. Você deixou, pra nós, muitas coisas, muitos exemplos, muitas histórias, muitas lembranças. Deixou também a Marildinha, sua companheira de tantos anos e uma tia incrível, que sente demais a sua falta, mas é uma mulher forte e está seguindo com a vida. E deixou quatro filhos sensacionais, meus primos amados. Ah, vou falar um pouco deles também.

Daniel, seu primeiro filho e o único sacudo, está bem obrigado, no trabalho e na vida. Continua sendo o “Punk mais pão doce de Curitiba”, como é chamado por suas amigas. É radical nas idéias e no caráter e muito gentil no trato com as pessoas. Carolina e Clarissa, sua gêmeas, são duas mulheres guerreiras. Carol na vida louca de São Paulo trabalha muito e construiu uma família linda, com o Adriano e o Pedro. Ela esbanja disposição para a vida. Clarissa, a pedagoga, apaixonada por crianças e que apesar de ter escolhido o frio de Porto Alegre e o mala do Fábio (a quem sabemos que você também amava) como marido, continua alegre, com aquele sorrisão. É muito esforçada e está se saindo uma mãe incrível para o seu neto Miguel. E tem também a sua temporona, a caçula Marina, que se formou há pouco tempo em jornalismo e já está trabalhando em São Paulo. Ela é inteligente, linda e cheia de personalidade. Você se orgulharia do que ela se tornou. De todos eles, aliás.
Vou parar por aqui, porque já escrevi demais e porque nessa altura as lágrimas já estão me cegando. Mas, tio, pode continuar me visitando. É bem vindo, como sempre foi, mas, sem trolagem, heim!

Pensei em publicar isso o mês que vem, em homenagem aos 3 anos da sua partida. Mas aí pensei, esperar pra quê? Esse papo é com o Betão e ele nunca gostou de esperar nada. Nem pra partir esperou, foi cedo e rápido, como sempre saía das festas, de fininho ou soltando um “vocês são tudo boa gente, mas eu vou é dormir”! E assim foi... Dormir!